Palestra do deputado federal General Girão (PL-RN), realizada no dia 25 de outubro, em Londres, com o tema: Guerra Cultural: Aprendendo com a História
É uma honra representar o Brasil neste fórum internacional. Uma honra que carrega responsabilidade: a de falar em nome de um povo livre, que tem lutado, geração após geração, para preservar sua soberania, sua fé e seus valores diante das ondas de relativismo e de manipulação cultural que desafiam o mundo contemporâneo.
Permitam-me começar com um símbolo. A bandeira do Brasil, que durante anos foi esquecida ou usada apenas em solenidades, voltou às mãos do povo nas ruas. O gesto simples de empunhar a bandeira tornou-se, no Brasil, um ato de resistência cívica, um sinal de esperança e de reencontro com a própria identidade nacional. Isso aconteceu porque, como em toda guerra cultural, os símbolos antecedem as ideias. E quando o poder tenta monopolizar o sentido dos símbolos, é o povo que lhes devolve o significado.
O que enfrentamos hoje — essa disputa por valores, narrativas e identidades — não é novo. As grandes batalhas de ideias acompanham a humanidade desde seus primeiros passos.
Como disse Cícero, na Roma Antiga: “A injustiça não pode ser transformada em lei.” Toda estrutura política, toda forma de poder, reflete decisões humanas que podem proteger ou oprimir, libertar ou aprisionar.
Na Antiguidade, o mundo aceitava como naturais práticas que hoje nos repugnam: gladiadores lutando até a morte para entreter multidões, povos conquistados transformados em escravos, impérios erguidos sobre ruínas de outros.
O Direito Romano, que até hoje influencia nossas instituições, nasceu nesse contexto: na tentativa de conter a barbárie pela razão. Do outro lado do Mediterrâneo, Aristóteles lembrava que “o homem é, por natureza, um animal político” — isto é, um ser que só realiza plenamente sua humanidade na convivência, no debate e na busca comum pela justiça.
Mas quando o Império Romano ruiu sob o peso de sua própria decadência moral, algo extraordinário aconteceu: pequenas comunidades de fé e trabalho preservaram a luz da civilização em meio às trevas.
São Bento de Núrsia e seus monges, retirando-se das ruínas do mundo antigo, fundaram mosteiros que se tornaram refúgios da cultura e da virtude. Enquanto a violência e a ignorância tomavam conta da Europa, os beneditinos copiavam livros, ensinavam crianças, e mantinham viva a chama do saber e da fé.
Eles mostraram que, mesmo quando o mundo parece perdido, a resistência silenciosa de poucos pode reconstruir o destino de muitos.
Ao longo dos séculos, o mundo se transformou. A escravidão, os impérios coloniais, os julgamentos arbitrários foram sendo superados por um ideal: a liberdade construída sobre a responsabilidade.
A civilização avançou quando compreendeu que a verdade não é uma concessão do poder, mas um dever da consciência.
Como lembrou o rabino Jonathan Sacks, que foi um dos mais respeitados pensadores religiosos do nosso tempo e uma voz lúcida em defesa dos valores judaico-cristãos, “para defender um país, precisamos de um exército; mas, para defender uma sociedade livre, precisamos de escolas.”
A liberdade política só se sustenta quando existe uma educação moral e espiritual que a alicerce. E, nesse sentido, a guerra cultural é, antes de tudo, uma disputa pela formação das novas gerações.
O filósofo Roger Scruton advertia que talvez a tarefa mais urgente do conservadorismo moderno seja libertar a educação do controle estatal e devolvê-la à sociedade livre — às famílias, às comunidades e às instituições que preservam a tradição.
Nenhuma civilização sobrevive quando entrega ao Estado o poder de formar o espírito de seus filhos. A batalha pela liberdade, portanto, começa na sala de aula, na família e na cultura cotidiana.
E é aqui que me permito recordar as palavras de Olavo de Carvalho, em 2006, no Jornal do Brasil: “Moderação na defesa da verdade é serviço prestado à mentira”. Essa frase condensa uma lição fundamental: a tibieza diante da mentira é cumplicidade com ela.
Quando a verdade se cala por medo de ser impopular, a falsidade se torna política de Estado. É por isso que a defesa da verdade, hoje, é o primeiro ato de coragem na guerra cultural.
Vivemos, Senhoras e Senhores, uma guerra que não é de armas, mas de ideias — uma guerra que redefine o que é permitido pensar, dizer e crer. E essa batalha se dá em todos os espaços: nas escolas, nas universidades, na imprensa, nas redes sociais, nas artes e até nas instituições. O campo de disputa é a cultura, e o objetivo é o mesmo de sempre: controlar a alma do homem livre.
No Brasil, a direita tem identificado que por décadas formou-se uma hegemonia cultural de esquerda, que dominou universidades, meios de comunicação, ONGs e setores do Estado. Essa hegemonia produziu uma visão única do mundo — relativista, materialista e hostil à tradição — enquanto classificava valores como fé, família, mérito e patriotismo como “retrógrados”.
Desde 2019, entretanto, um movimento político e social conservador ganhou voz no Congresso e nas ruas. Foi uma reação cultural que se traduziu em ação parlamentar:
– Na educação, com propostas que defendem a neutralidade ideológica nas escolas e o direito das famílias sobre a formação moral dos filhos.
– Na vida e na ética, com projetos que reforçam a proteção à vida desde a concepção e se opõem à banalização do aborto e das drogas.
– Na liberdade religiosa e de expressão, com iniciativas que defendem símbolos de fé e garantem espaço para opiniões divergentes.
– Na segurança e na legítima defesa, com debates que buscam restabelecer o equilíbrio entre o cidadão cumpridor da lei e o poder coercitivo do Estado.
Essas pautas não são extremas: são a defesa do senso comum, da verdade natural e da dignidade humana. E, como nos recorda Scruton, nenhuma dessas causas é possível se a sociedade renunciar ao seu papel formador.
A cultura e a educação não pertencem a governos; pertencem ao povo, às famílias, às igrejas, às comunidades. São esses espaços que moldam o caráter e mantêm viva a liberdade.
Em muitos aspectos, o Brasil se inspirou em experiências internacionais.
Um exemplo emblemático vem da Polônia, que, após décadas sob o jugo ideológico, reconstruiu sua soberania cultural e moral com base em valores cristãos e familiares.
Hoje, o país é visto como um case de sucessona resistência à uniformização cultural imposta por organismos internacionais.
A Polônia compreendeu que a liberdade cultural é o último bastião da independência nacional. Essa reconstrução moral lembra o espírito de São Bento e dos antigos mosteiros: reconstruir o mundo a partir de pequenas comunidades de fé, trabalho e ensino.
E o Brasil, de maneira análoga, começa a erguer suas próprias “ilhas de resistência” — nas escolas independentes, nas famílias que ensinam valores, nos movimentos cívicos que restauram o orgulho de ser brasileiro.
Como dizia novamente Olavo de Carvalho, em 2005, no Diário do Comércio: “Conservadorismo significa fidelidade, constância, firmeza. Não é coisa para homens de geleia.”
Ser conservador, portanto, é recusar a covardia intelectual e defender, com firmeza, o que construiu a civilização ocidental: a verdade, a lei natural, a família e a fé.
No Brasil, essa postura ganhou nomes e rostos. O Dr. Enéas Carneiro foi um dos primeiros a denunciar a engenharia social e a submissão ideológica do país. Mais tarde, o então deputado Jair Bolsonaro ressignificou a bandeira nacional, transformando-a em símbolo de pertencimento popular e em emblema da resistência ao sistema.
O simples ato de erguer a bandeira tornou-se um gesto antissistema, porque afirmava o direito de amar o próprio país e de rejeitar a manipulação de uma elite cultural desconectada da realidade do povo. E não nos esqueçamos: essa guerra de ideias, embora travada em cada país, é global.
Quando a liberdade de expressão é cerceada, quando a censura é disfarçada de “proteção contra o ódio”, quando se tenta impor pensamento único, não estamos diante de progresso, mas de retrocesso autoritário.
Como alertou o cientista político Karl Deutsch, “a política é o controle mais ou menos imperfeito do comportamento humano.”
Se a política se afasta da verdade, torna-se instrumento de coerção. Se se aproxima da verdade, torna-se instrumento de libertação.
Por isso, repito: a guerra cultural é, antes de tudo, uma guerra pela verdade. E nela, a moderação pode ser uma forma de rendição.
Senhoras e Senhores, a responsabilidade que recai sobre nós — líderes, parlamentares, cidadãos — é aprender com a história para não repetir seus erros.
Quando deixamos que a mentira se disfarce de virtude, abrimos as portas para a servidão. Mas quando sustentamos a verdade com coragem, abrimos caminho para a liberdade. O protagonismo é de todos. Cada pessoa tem uma missão nesta guerra. Não podemos desistir. Esta é, sim, a batalha do bem contra o mal — a batalha pela alma de nossas nações e pela dignidade do ser humano.
Como disse Winston Churchill: “O preço da liberdade é a eterna vigilância.”
Que essa vigilância nos acompanhe — e que dela nasça a esperança que move o mundo livre.
Londres, 25 de outubro de 2025
Deputado Federal Eliéser Girão Monteiro Filho (PL-RN)